Quando em 09 de agosto de 2021, o então ministro da educação, Milton Ribeiro, disse em entrevista à TV Brasil que "as crianças com deficiência atrapalham o aprendizado dos outros", houve um coro de indignação, ao qual me somei, apontando o capacitismo presente na declaração. Agora, em 2023, quando o presidente Lula afirma que "são quase 30 milhões com problema de desequilíbrio de parafuso" e associa crimes em escolas à deficiência intelectual, novamente me junto às vozes indignadas contra mais uma fala preconceituosa.
Sabe por que me indignei lá, me indigno aqui e vou me indignar sempre que presenciar atos capacitistas? Porque não considero a causa das pessoas com deficiência – que é a minha causa - como mero expediente de ataque a adversários políticos.
Vou te explicar meu ponto, mas primeiro deixe-me te contar o que é capacitismo, pois trata-se de termo relativamente novo e que até pouco tempo - precisamente até a fala do Lula - era tratado por alguns como "mi mi mi".
Capacitismo é a discriminação e o preconceito contra pessoas com deficiência. A ideia capacitista surge do senso comum de que tais pessoas têm todas as capacidades limitadas ou reduzidas e que, portanto, não são autônomas para gerir a própria vida. Essa compreensão, assimilada socialmente ao longo dos anos, se materializa em atitudes que excluem e oprimem quem tem alguma deficiência, como exemplificam as falas de Milton e Lula. Outro exemplo de atuação capacitista foi a de Bolsonaro quando perguntou com deboche como um atleta surdo gritaria "eu ganhei" nas Sordolimpíadas em 2021.
Falado do capacitismo, falo agora do oportunismo que também é capacitista.
Quando gritamos contra o preconceito que se institucionalizou no governo passado, fomos tachados de vitimistas. Quando nos insurgimos contra humoristas que usaram pessoas com deficiência para tornar mais engraçadas suas apresentações de stand up, disseram que estávamos contra a liberdade de expressão. Aquela emissora velha que tem nome de jovem – que talvez seja a melhor representação do reacionarismo brasileiro – sempre lançou mão dos seus "veja bem", "não é bem assim", etc., para minimizar atitudes de preconceito explícito. De uma hora para a outra, todos passaram a usar novos pesos e novas medidas para se tornarem vexilários de uma causa. Por quê? Porque o capacitista da vez não é o mito.
É OPORTUNISMO QUE FALA!
Diferente não é o caso daqueles que, pela veemência com que gritaram contra Milton e Jair lá atrás, até pareciam verdadeiros militantes da luta pelos direitos das pessoas com deficiência, mas agora se omitem em face da fala de Lula. O que grita agora, é o silencio dessa gente em face do capacitismo de seu representante. Por quê? Porque o capacitista da vez é o ídolo da esquerda.
O oportunismo também é capacitismo.
Enquanto se seleciona qual violação de direitos receberá críticas, se vira às constas para as pessoas com deficiência. Não importam as lutas e os direitos. Não importa a nocividade do capacitismo. O que importa para os oportunistas é a contemplação desse ou daquele lado na arena da disputa política. Vale mais beijar a mão do ídolo político e cuspir no adversário, nem que para isso, eventualmente, seja necessário fazer de contas que se importa com a diversidade, com a inclusão, com a acessibilidade e com o preconceito. Nesse senário, as pessoas com deficiência e suas lutas por autonomia e vida digna são tratados como meros joguetes de lados opostos.
Certo é que nunca faltará um "herói" de ocasião que se levantará para vociferar um suposto altruísmo e se arrogar porta-voz de todos os deficientes. Mas só quando for conveniente! Quanto a nós, os que militamos genuinamente pela causa, não nos interessa a rasteira disputa política, o que nos move é a constante necessidade de nos opormos a todo e qualquer tipo de preconceito e discriminação contra as pessoas com deficiência, venha do lado que vier.
Opinião do colunista Agnaldo Borcath.