Jair Bolsonaro, questionado sobre o envolvimento da deputada federal Carla Zambelli com o hacker da "vaza jato", respondeu: "Eu estive com ela [Carla Zambelli] antes das eleições do ano passado. Nunca mais tive com ela, nem atendi telefonema dela. Ela queria falar comigo um tempo atrás, não respondi...".
A postura do ex-presidente em relação a uma de suas mais fiéis aliadas me faz lembrar um episódio do seriado Chaves. Aquele em que a personagem Chiquinha contrai catapora. A menina peralta tenta se aproximar do senhor Barriga e dos demais moradores da Vila, mas todos a rechaçam, afinal, ninguém quer ser contaminado pela doença contagiosa.
A justificar a comparação, lembro que a tosquice anda de mãos dadas com o bolsonarismo. No ambiente bolsonarista, quem pede intervenção dos militares requisita ajuda aos Ets; o que suplica a atenção divina usa pneus como totens; o que depreda os prédios dos três poderes filma o ato, produzindo provas contra si mesmo. Genial!
É claro que não se pode fechar os olhos para as intenções malignas sempre presentes no espírito fascista que move a extrema direita. Todavia não é pecado se divertir com as pérolas produzidas pelos "patriotas", em suas atuações dignas de comparação com os mais engraçados personagens de Roberto Gómez Bolaños, criador do Chaves.
O golpismo patético, que nem por isso deixa de ser perigoso, tem lá sua graça. E Zambelli talvez seja a personagem que melhor exemplifica essa direita atarantada que nos preocupa e ao mesmo tempo nos diverte.
Entre as trapalhadas da deputada teve a gravação de um vídeo em frente a uma filial da Havan onde ela diz, com convicção, que as lojas pertencem à filha da ex-presidente Dilma Rousseff. Depois se descobriu que a empresa pertencia a Luciano Hang, que se mostrou um dos mais ferrenhos bolsonaristas. Teve também aquela atabalhoada tentativa de reconciliar o então presidente Bolsonaro com o então ministro da Justiça Sergio Moro, que acabou ocasionando o rompimento dela própria com seu padrinho de casamento. Há poucos dias, Carla fez mais uma de suas peripécias. Mandou um colega de parlamento abandonar copos e xícaras, para tomar sei lá o que, em um lugar não apropriado para o consumo de líquidos, e acabou tendo de pedir desculpas no Conselho de Ética da Câmara.
E não podemos nos esquecer, é claro, da cereja do bolo, quando às vésperas das eleições de 2022, a bolsonarista correu armada atrás de um cidadão, atitude que, para muitos, influenciou decisivamente na derrota do Capitão.
Porém os esquetes revelados mais recentemente sobre a deputada parecem superar todos os outros. Nos enredos têm encontros fortuitos de Carla Zambelli com Walter Delgatti Neto. O agora colega de cena da bolsonarista estreou nos palcos políticos no trágico episódio envolvendo o judiciário, conhecido como "vaza jato", em que foram divulgadas mensagens do Telegram entre o então juiz, agora senador, Sérgio Moro e o então procurador, hoje deputado cassado, Deltan Dallagnol.
A Deputada teria contratado o hacker para, entre outras coisas, invadir o site do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e inserir um falso mandado de prisão contra o ministro do STF Alexandre de Moraes. Segundo Delgatti, Zambelli teria encaminhado o texto pronto, porém ele precisou fazer algumas correções gramaticais, antes de inserir o documento no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões do CNJ. Detalhe: o mandado seria subscrito pelo próprio ministro. Isso mesmo, Carla teria criado o incrível esquete em que Moraes condena a si mesmo e finaliza dizendo: "Publique-se, intime-se e faz o L".
"Teje preso!", diz Alexandre de Moraes para si mesmo no mandado apócrifo.
Por essas e por outras, Bolsonaro quer distância de Carla Zambelli. O mito da direita nonsense brasileira teme ser contaminado pela "catapora" que acometeu a deputada. Não duvido nada que para se buscar maior afastamento entre o ex-presidente e a parlamentar, as hordas bolsonaristas comecem a levantar nas redes a tag #zambellicomuna. O que, convenhamos, seria também engraçado.
Porém o problema para Bolsonaro é que, conforme confirmado pela própria Carla Zambelli, ele esteve no mesmo ambiente com a deputada e Delgatti. Nesse caso, a depender do grau de intimidade envolvida no "trisal", é possível que o ex-presidente já esteja até contaminado. Vai saber...