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Opinião

Vão ficar chorando até quando?

Questão de Opinião / Agnaldo Borcath


Após a decisão do TSE que tornou Bolsonaro inelegível surgiram muitas manifestações de correlegionários dizendo que o ex-presidente foi condenado por uma decisão política. Relaciono aqui alguns comentários de bolsonaristas sobre o 5 a 2 para a democracia e depois trago algumas considerações jurídicas e livres de paixões.

O presidente nacional do PL, Valdemar da Costa Neto afirmou no seu perfil do Twitter ser "a primeira vez na história da humanidade que um ex-presidente perde os direitos políticos por falar".

O General Braga Neto, que foi vice na chapa de Bolsonaro, mas que escapou da inelegibilidade, também usando o Twitter, afirmou que "a prerrogativa de milhões de brasileiros de escolher democraticamente seu representante" foi invalidada.

Nikolas Ferreira afirmou no programa Pânico da Jovem Pan que Bolsonaro "é cara que merecia ter pelo menos o direito de ser escolhido pelo povo nas urnas".

Destaco três pontos que fazem parte da retórica bolsonarista para colocar o ex-presidente na posição de "vítima do sistema": i) Bolsonaro é um democrata que sempre lutou pela liberdade de seu povo; ii) Bolsonaro perdeu os direitos políticos porque emitiu opinião sobre o sistema eleitoral; e iii) a decisão contra o Bolsonaro se contrapõe ao direito de a população escolher seus representantes.

A primeira premissa é absolutamente falsa. Desnecessário repisar o que o ex-presidente defendeu antes de chegar a mandatário da República - exaltar a ditadura militar, idolatrar torturadores etc. -, basta considerar que na posição de presidente, Jair Bolsonaro cortejou a ruptura institucional e por ela foi cortejado.

Em 7 de setembro de 2021, o então presidente afirmou taxativamente a uma multidão na Avenida Paulista, em São Paulo, que não se submeteria mais a nenhuma ordem judicial proferida pelo Ministro do STF Alexandre de Moraes. Ao som da turba que gritava "eu autorizo", o comandante em chefe sugeria a saída de ministros da Suprema Corte. O mesmo ato se repetiu na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.

Bolsonaro não é nem nunca foi um democrata. Tanto não é que os claros movimentos golpistas, que foram revelados pela quebra do sigilo do celular do ajudante de ordens Mauro Cid, aconteceram debaixo do nariz do presidente e só não culminaram com a ruptura porque faltou apoio na cúpula das Forças Armadas. Vale dizer que, ainda que o ex-presidente não tenha concorrido diretamente para as articulações golpistas, na pior das hipóteses prevaricou. Ao tomar conhecimento dos crimes, tinha o dever funcional de repeli-los.

O segundo ponto que precisa ser desmentido é que Bolsonaro se tornou inelegível porque criticou o sistema eleitoral. Nas 200 páginas do voto do Ministro Benedito Gonçalves e nos votos dos outros quatro ministros, fica claro que a condenação de Bolsonaro se deu por abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação.

O abuso de poder político é o ato de agente público desviado de sua finalidade e com intenção de interferir no processo eleitoral. Julgados anteriores do próprio TSE apontam que tal abuso ocorre quando a estrutura da administração pública é utilizada em benefício de determinada candidatura. Por outro lado, o uso indevido de meios de comunicação acontece quando se expõe desproporcionalmente um candidato em desfavor dos demais, o que acaba por ocasionar desequilíbrio na disputa.

Bolsonaro foi condenado à inelegibilidade porque em 18 de julho de 2022 convocou embaixadores de países estrangeiros com o objetivo de criticar o sistema eletrônico de votação e descredibilizar a atuação da corte eleitoral e, com isso, obter vantagens eleitorais. O desvio de finalidade é claro, pois a convocação de embaixadores por Presidente da República não se destina ao fim pretendido por Jair Bolsonaro. Tanto é que, Carlos Alberto França, Ministro das Relações Exteriores de Bolsonaro, testemunhou no processo, deixando claro que o tema eleições não se relaciona com política externa e afirmou: "não é função do Itamarati, nem mesmo constitucional, de que nós nos ocupemos de temas eleitorais".

Para completar o quadro de ilegalidade, o evento foi transmitido pela mídia estatal TV Brasil e pelas redes sociais de Jair Bolsonaro no Facebook e no Instagram que sempre tiveram milhões de seguidores. Foi informado na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) que em 18/08/2022, um mês após à reunião com embaixadores, o vídeo do evento se encontrava disponível nas redes sociais de Bolsonaro e contabilizava aproximadamente 589 mil visualizações no Facebook, com 55 mil comentários e 72 mil curtidas; e 587 mil visualizações no Instagram, com 11 mil comentários. Na mesma data o YouTube já havia removido espontaneamente o vídeo do canal mantido pelo ex-Presidente, por entender que o material violava sua política de integridade.

Quanto à TV Brasil, sem contar a audiência ao vivo e repercussão por meio de matérias veiculadas na grade de programação da emissora, verificou-se o engajamento do acesso via links em redes sociais da TV BrasilGov, a saber: a) no Twitter foram 1.186 retweets, 77 tweets e 3.904 curtidas, sendo que, no vídeo inserido no link, aparece o total de 62.200 espectadores; b) na live no Facebook foram 178 mil visualizações da postagem na página, 348.400 pessoas alcançadas, 20 mil reações (curtidas e similares) na postagem da página e 43.300 reações, comentários e compartilhamentos.

Em resumo: Bolsonaro se serviu da estrutura do Estado brasileiro para se reunir com embaixadores no Palácio da Alvorada com a intenção clara de se beneficiar do engajamento de seus seguidores mirando nas eleições de 2022 que se avizinhavam. Por outro lado, as autoridades estrangeiras presentes ao encontro foram apenas peças usadas pelo mandatário para atingir um público externo por meio da TV Brasil e das redes sociais.

O ato, portanto, foi feito POR e PARA Jair Messias Bolsonaro, cujo efeito pretendido era, conforme palavras do Ministro relator Benedito Gonçalves, "o de estimular engajamento político a partir não de pautas propositivas, mas da mobilização de paixões, especialmente medo e raiva". Eis configurados, de forma clara e objetiva, o abuso de poder político e o uso indevido de meios de comunicação.

Por fim, cumpre esclarecer que a decisão que cassou os direitos políticos de Bolsonaro por oito anos não se contrapõe ao direito de a população escolher seus representantes. Nesse ponto é preciso que se considere que o abuso de poder representa uma realidade que afeta a liberdade do eleitor e vai de encontro com a igualdade entre os candidatos. É ato que compromete a normalidade e a legitimidade das eleições. É como quando em uma partida de futebol um gol é anulado porque o atacante intencionalmente dominou a bola no braço. Os votos alcançados por alguém que cometeu abusos são anulados porque obtidos sem a observância das regras do jogo.

De resto, o choro é livre, porém é cabível a Bolsonaro e seus seguidores a seguinte admoestação: CHEGA DE MI-MI-MI! Afinal, vão ficar chorando até quando?

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