Além das diversas questões que estão no radar para as ações da Petrobras (PETR3;PETR4), como política de preços e de dividendos, as mudanças tributárias também estão no radar dos investidores.
Em relatório recente, o Itaú BBA destacou as possíveis mudanças nos preços de transferência (MP 1.152) na petroleira.
A Medida Provisória 1.152 introduz o princípio de “arm"s length” para preços de transferência, alinhando as regras brasileiras de preços de transferência com os princípios da OCDE. Ou seja, a MP propõe uma nova regra para transações com controladas, que iguala o tratamento fiscal das transações com terceiros.
Assim, estabelece que os preços das mercadorias vendidas a partes relacionadas (ou seja, no caso de vendas intercompanhias) devem ser comparáveis aos preços de mercado de transações semelhantes entre partes não relacionadas.
A Petrobras utiliza uma subsidiária internacional para exportar parte de sua produção de petróleo. Para efeitos de impostos, os preços de transferência são baseados nos preços de referência publicados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP).
A Petrobras exportou cerca de 500 mil barris por dia (kbpd) de petróleo em 2022, o que representou 36% do total do Brasil
exportações de petróleo de 1,4 milhão de bpd no período. Assim, apenas parte dos recursos estimados a serem captados pelo governo por meio da aplicação da Medida Provisória sobre o setor petroleiro viria da Petrobras.
“Estimamos um impacto potencial para a Petrobras da ordem de US$ 2,60 por barril exportado de petróleo bruto levando em conta a potencial variação dos preços de transferência, o que implicaria um aumento de US$ 564 milhões em impostos por ano. Vemos isso como imaterial, uma vez que corresponde a menos mais de 1% do faturamento total da empresa”, afirmam os analistas.
Eles observam que essas estimativas podem mudar com base em ajustes no preço de referência da ANP e/ou variações nos preços e volumes reais de exportação da Petrobras.
Dado que a maior parte das exportações da Petrobras vem de Búzios e Tupi, os analistas do BBA utilizaram esses campos como referência em seu exercício para estimar o impacto potencial para a Petrobras.
O Morgan Stanley destacou que contingências fiscais e mudanças nas regras de tributação que estão no radar são uma ameaça constante para as empresas brasileiras. Contudo, embora os números da Petrobras sejam geralmente superlativos, eles não veem razão para acreditar em uma fuga de caixa descomunal da empresa neste momento.
Na avaliação do banco, potenciais mudanças nas regras de preços de transferência produziriam um impacto limitado nos fluxos de caixa da Petrobras (máximo de cerca de US$ 700 milhões em 2022). Existem diferentes regras que estabelecem estruturas de preços de transferência no Brasil, que podem envolver um modelo “cost plus” (que compara os lucros brutos com o custo das vendas), preços de referência divulgados por órgãos reguladores, entre outros.
Nos últimos anos, o setor de petróleo mudou os preços de transferência do modelo de custo adicional discricionário para os preços de referência publicados pela ANP para cada cadeia de petróleo produzida no país. Além disso, uma mudança tributária a partir de 2014 exige que os resultados das subsidiárias estrangeiras sejam consolidados no Brasil, com um imposto retido de 34%.
As vantagens fiscais ainda são possíveis se as subsidiárias estrangeiras tiverem uma compensação de prejuízos fiscais. Se o resultado consolidado das subsidiárias estrangeiras apresentar prejuízos operacionais, o benefício dos preços de transferência pode ser absorvido e produzir uma compensação fiscal no Brasil.
“Calculamos um benefício fiscal máximo teórico para a Petrobras de cerca de US$ 700 milhões em 2022. Com base em uma amostra de campos de petróleo offshore, calculamos um preço médio de referência publicado pela ANP de US$ 88,5 o barril (bbl) nos últimos três trimestres, que se compara ao preço do petróleo realizado da Petrobras de US$ 96,5/bbl no mesmo período. Aplicando o preço de transferência de US$ 8,0/bbl às exportações da empresa em 2022, o lucro offshore teórico seria de US$ 2,1 bilhões. Supondo que as subsidiárias estrangeiras da empresa tenham prejuízos fiscais suficientes, o potencial máximo de economia fiscal chegaria a US$ 714 milhões (1,0% do valor de mercado, 2,0% do lucro líquido e 2,2% do fluxo de caixa livre)”, afirmam.
Uma revisão do preço de referência da ANP, mais próximo do Brent e da Petrobras, seria uma alternativa para o governo aumentar a arrecadação daqui para frente.
A liquidação de contingências fiscais poderia produzir um impacto potencial de caixa maior, de US$ 6,3 bilhões, mas de natureza não-recorrente e seguindo um procedimento de governança estruturada.
“Entendemos que a Petrobras toma decisões para resolver disputas fiscais se a proposta econômica for atraente o suficiente (ou seja, um grande corte da dívida), ou se ela vê uma probabilidade muito alta de perder o processo judicial. A aprovação de um acordo tributário é baseada na recomendação da equipe técnica jurídica da empresa, seguida de discussão com base em compromissos estatutários internos (incluindo o comitê de partes relacionadas), da diretoria executiva e, finalmente, a aprovação do Conselho de Administração”, aponta o Morgan.
Os analistas entendem que o Tribunal de Contas da União (TCU) acompanha de perto essas discussões e acordos, de forma a evitar repasses ilícitos de recursos de empresas públicas. Ainda assim, caso seja identificado conflito de interesses entre a Procuradoria Geral da República e a empresa, as partes em conflito devem se abster de votar no acordo tributário em discussão.
Usando um nível semelhante de haircuts (diminuição do valor de alguma dívida) versus acordos anteriores, o potencial impacto no caixa chegaria a US$ 6,3 bilhões (8,9% do valor de mercado e 21% do FCF esperado para 2023).
O valor nominal das disputas fiscais inclui vários anos de ajustes monetários, juros, taxas e multas. Os acordos entre a Petrobras e as autoridades fiscais desde 2017 tiveram um haircut médio de aproximadamente 80%, já que as autoridades normalmente perdoam a maioria dos ajustes monetários e multas.
“É importante ressaltar que nossa estimativa de US$ 6,3 bilhões pressupõe que 100% dos casos pendentes sejam resolvidos em um único ano, o que é altamente improvável. Assumindo uma liquidação linear ao longo dos próximos cinco anos, o valor anual de cerca de US$ 1,3 bilhão representaria cerca de 4% do fluxo de caixa livre (FCF).
O Morgan segue com recomendação equalweight (exposição em linha com a média do mercado, equivalente à neutra) para os ADRs (recibos de ações negociados na Bolsa de Nova York) PBR (equivalente aos ordinários) da estatal.
“Esperamos volatilidade contínua à medida que a nova administração e o Conselho de Administração assumem o cargo e começam a compartilhar sua visão e estratégia para a empresa estatal. Decisões recentes sobre impostos sobre combustíveis e a criação de um imposto temporário sobre a exportação de petróleo levantaram a bandeira amarela do setor e aumentaram o clima de intervenção nas estatais. Achamos que é uma questão de tempo para as políticas da estatal mudarem, mas precisamos ter mais visibilidade sobre o quão prejudiciais elas podem ser para a lucratividade e geração de caixa, então ficamos à margem apesar do valuation muito barato”, apontam os analistas.
O BBA também tem recomendação equivalente à neutra (marketperform, desempenho em linha com a média do mercado) para as ações da estatal petroleira.